domingo, 13 de abril de 2014

E viver, o que é mesmo?

E viver, o que é mesmo?

Sim, o que é viver? Nesses dias turbulentos o poema de Carlos Drummond de Andrade está mais atual que nunca e nos ajuda a compreender nosso momento:

“Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram. 
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco”.

Duro é ver que em nossos dias, a vida se tornou inútil, sem valor algum. Desesperadamente perdemos a beleza, a vitalidade e o prazer de viver. De todos os lados podemos ver culto ao ódio. Por que nos tornamos tão intolerantes? Talvez não seja surpresa, pois a vida é isso. Há dias de paz e de guerra. O que não vale a pena é perdermos a nossa capacidade de leitura da vida, de compreensão profunda de sua tessitura. Viver é lutar, é ultrapassar as barreiras que insistem em nos calar, em nos oprimir, em nos proibir de ser o que somos. E quando nos impõe uma ordem, quando nos oprime, se instaura a via exclusiva de produção de texto e sentido. Daí nos cabe desconstruir a leitura única do mundo.

Não negamos que às vezes nos assusta ver como o outro trata seu par. Mas partindo do pressuposto que a natureza humana é dialética, complexa e infinita, então nos damos conta que não são surpreendentes atitudes que violam o direito à vida. Mas isso não significa que somos complacentes com a violência. De maneira nenhuma. A violência é histórica e tem que acabar. Mas, como na sociedade existe o conflito, o que é normal, esse nos ajuda a crescermos e sermos mais altruístas.  O desafio é encarar o “outro” como aquele que é “eu”. Eis a estratégia para ler a vida.

Mas que posição devemos tomar? Cremos que a resposta possível é ter uma atitude empática, uma maneira de encarar a vida como um texto inacabado. Nesse contexto, o eu/outro é o leitor que produz a escritura, compartilha vozes, interpretação e produção de sentido no tecer da vida. Se observarmos bem, a cada momento em nosso entorno nos enfrentamos com atitudes racistas, homofóbica, discriminação de todo tipo, misoginia e todas as violências correlatas. É necessário, mais do que nunca encarar a vida como desafio real e como possibilidade de leituras pluritextuais desmistificadas. 

Quem sabe o poeta Drummond no poema “Os ombros suportam o mundo”, que começamos essa reflexão, já nos tenha dado uma pista:


“Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação”.

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